Com o prato feito, não há mais o que fazer pela sua cintura,
certo? Errado. A própria forma como o alimento é processado pela boca faz toda
a diferença na balança
por Theo Ruprecht • design Fred Scorzzo e Laura Salaberry •
foto Dercílio – Saude.abril.com.br
Estômago, intestino, pâncreas, fígado...Esses e outros órgãos participam da digestão de qualquer
comida — e realizam seu trabalho com autonomia total. Mesmo assim, não dá para
dizer que o sistema digestivo é independente do começo ao fim. Isso por causa do
abrir e fechar da boca, responsável pela quebra de certos nutrientes em
partículas menores e, logo, mais fáceis de ser trabalhadas. Acontece que, seja
pela enorme quantidade de tarefas do dia a dia, seja pelo costume, até as
mordidas estão sendo automatizadas para abreviar o tempo à mesa.
E essa pressa, por sua vez, vem se mostrando mais nefasta do
que se imaginava, inclusive para quem pretende manter o corpo em forma. Em um
estudo da Universidade Oxford Brookes, na Inglaterra, voluntários que mascaram
cada porção por 35 vezes simplesmente comiam menos quando comparados aos
glutões que só repetiam o movimento dez vezes. "A própria contração
muscular serve de estímulo à liberação de substâncias responsáveis pela
sensação de saciedade", explica o nutrólogo Durval Ribas Filho, presidente
da Associação Brasileira de Nutrologia, em Catanduva, no interior paulista. Em
outras palavras, mastigar o que você ingere por poucas vezes implica voracidade
intensa e prolongada, o que costuma terminar em comida demais no estômago. Aí,
a barriga cresce.
Mais do que a quantidade de dentadas, a maneira como elas
são distribuídas pode aplacar ou fomentar o apetite. Um experimento brasileiro,
por exemplo, revela que a frequência de obesos que mastigam com apenas um lado
da boca é significativamente maior do que a de indivíduos no peso adequado.
"O contato do bolo alimentar com toda a cavidade oral aparentemente é
importante à saciedade", reforça Cintia Cercato, endocrinologista do
Hospital das Clínicas de São Paulo e orientadora da pesquisa. "A
mastigação bilateral tem repercussão, por via nervosa, no hipotálamo, a área do
cérebro que controla a fome", completa o odontologista José Amorim, da
Universidade Estadual Paulista, em São José dos Campos.
Existe uma tese segundo a qual o gosto também mexeria com o
apetite. Ou seja, quanto maior a intensidade do sabor, menor seria o risco de
se empanturrar simplesmente para satisfazer as papilas gustativas. Mas e o que
isso tem a ver com mastigação? A resposta veio da Universidade de Maastricht,
na Holanda, onde cientistas observaram que o número de mordidas culminava em
uma percepção aumentada do aroma e do sabor de pedaços de chocolate amargo.
"O assunto é tão interessante quanto controverso", pondera a
endocrinologista Rosana Radominski, presidente da Associação Brasileira para o
Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica, em Curitiba, no Paraná.
Mesmo que os experts ainda vejam o tema com certa
desconfiança, um fato é irrefutável: dentadas ntervaladas e tranqüilas
contribuem para porções menos avantajadas inclusive pelo tempo que consomem.
"A chegada dos primeiros bocados de comida ao intestino, fato que demanda
alguns minutos, serve como mais um sinal de saciedade. Portanto, se a ingestão
é muito rápida, a sensação de barriga cheia vem tarde demais", esclarece
Rosana. Estima-se que todos os mecanismos de regulação da fome só funcionem a
pleno vapor após 15 minutos desde a primeira abocanhada. Durante essa fase, é
essencial maneirar na quantidade de garfadas — e abusar dos músculos que mexem
a mandíbula.
Agora, por mais disciplinado que você seja, é impossível
manter, só pra citar um exemplo qualquer, creme de milho na boca por muito
tempo. Imagine mordê-lo 30 vezes! "Por isso, é preferível optar por
alimentos mais sólidos, principalmente nas garfadas iniciais", recomenda
Gerson Kohler, ortodontista e ortopedista facial da Universidade Federal do
Paraná, em Curitiba.
Em vez da cenoura ralada, aproveite o legume inteiro. A
banana amassada pode dar lugar à fruta original. O pimentão cru é mais
interessante do que o cozido, e por aí vai. No final das contas, o recado que
fica é investir na consciência e na tranquilidade em todas as etapas da
alimentação: da escolha do cardápio até a derradeira mordida.
A mordida que esvazia os pneus
Pequenos ajustes no modo como você tritura refeições com os
dentes podem se tornar grandes ajudantes da dieta e dos exercícios na
manutenção do peso
Quantidade
Antes de engolir, abra e feche o maxilar por pelo menos 30
vezes em cada ida do talher aos lábios
Duração
Tenha calma. O intervalo entre uma garfada e outra deve ser
de aproximadamente 20 segundos
Qualidade
Use a língua para dividir o alimento entre os dois cantos da
boca. Ao longo da mastigação, reveze-os de lugar constantemente.
Alimento
Sempre que possível, escolha as versões mais sólidas dos
alimentos para que a mastigação fique lenta.
Um aparelho contra a obesidade?
O nome esquisito — dispositivo bariátrico intrabucal —
esconde um método simples. Ele é uma espécie de aparelho ortodôntico a ser
colocado no céu da boca em toda refeição para diminuir o espaço nessa cavidade,
obrigando o indivíduo a triturar a comida antes de engoli-la. "Não há
incômodo e a redução de ingestão chega a 20%. Mas o paciente precisa passar por
uma avaliação, porque não é recomendado para todos", diz Kohler.